quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Maria, substantivo mais que próprio

Maria Antônia Guimarães Silva, 62 anos, negra, mãe de cinco filhos, dois homens e três mulheres, aposentada, atualmente mora na cidade de Santa Maria da Vitória, porém antes morava na zona rural deste município, no povoado de Santo Antônio. Casada, mas, depois de vinte e dois anos sendo maltratada pelo esposo, criou coragem e divorciou dele.

Por conta de tantos obstáculos, só pode estudar até a quarta série. Mesmo assim, não foi consecutivo, pois estudava um ano, paravam outros, e assim ia “atrofiando” o que aprendia a cada vez que tinha que acompanhar, juntamente com a filharada, o marido que trabalhava nas fazendas do entorno onde morava.

Ela teve muitas dificuldades na aprendizagem, em virtude de não dar conta de acompanhar o ritmo dos colegas, e nem sempre, ou nunca, os professores observavam tal situação, já que não apresentavam interesses em ensinar aos que tinham Déficit de Aprendizagem. Apesar disto, Maria não deixava se abater, e sempre procurava correr atrás, quando não entendia determinado conteúdo.

As disciplinas de matemática e português sempre foram vista como um “bicho papão” na vida da coitada, contudo, ela procurava fazer a diferença refletindo às teorias em casa (isto dificilmente é possível na escola), quando o marido não estava presente, pois esse não consentia o estudo dela. Assim como tantas outras Marias, ela desenvolveu o seu próprio “método” de ensino, melhor, de aprendizagem. Foi através dos alimentos que consumia em casa, que ela foi percebendo a presença das aludidas matérias. Identificou nos alimentos que tinham embalagem timbrada, que algumas letras eram diferentes, e concluiu que isso fazia com que eles tivessem nomes um tanto desiguais. Observou isso também com os nomes dos seus filhos, mesmo que todos começassem como a letra J – J que escreve também José! Ingrato ex-esposo.

Percebeu que cada vez que pegava um ovo no poleiro, a quantidade aumentava, assim, estaria fazendo uma conta aditiva (soma); e quando fritava-os no almoço, para a família ocorria o contrário – diminuía. Nesse sentido, pode notar que todas às disciplinas escolares, se bem vista pelo professor e pelos colegas, estavam perto de todos.

Devido à aprendizagem que teve em matemática, Maria passou a sentir menos falta de seu ex-esposo que tanto a maltratava, pois entendeu que a presença dele no lar, ajudava a diminuir sua alegria, tornando o ambiente opaco; enquanto a dos filhos aumentava a vontade de viver. Mesmo que às vezes diminuíram, já que alguns tiveram que ir embora para Goiânia em busca de melhores oportunidades de trabalho. Não puderam “desfrutar” nem mesmo do ínfimo estudo que à mãe teve.

Ela igualmente aprendeu em português, que o verbo amar pode ser conjugado em tempo presente, no entanto, pode se conjugar também no passado. Embora o amor possa ser também um substantivo concreto, também pode ser um substantivo abstrato. Assim como o nome José pode ser um substantivo próprio, ele pode ser um substantivo simples... vai depender do ponto de vista de quem olha.

Diante das adversidades, e contrariando a curiosidade, Maria teve que parar seus estudos, embora tenha notado que teve um melhor aproveitamento, quando percebeu a presença dele em sua vida... fora da escola.

Justino Cosme, estudante,